— Depois de mim? Depois de mim virá alguém. Não me perguntem quem.
Sentou-se e olhou para a plateia. Quem lançara a pergunta que silenciara a sala encontrava-se de pé. Ele dera a resposta que solidificara esse silencio. Todos os olhos se agarravam ao fato cinzento, à camisa azul e à gravata cinza-azulada do homem que olhava em volta com a boca ligeiramente aberta. Parou o olhar em cima do palco. Na cadeira. Naqueles olhos que lhe questionavam o que tencionava fazer. Falar, sentar ou sair, a escolha era dele. Decidiu sentar-se.
— Enquanto eu aqui estiver, não vale a pena questionar quem virá depois de mim. — Levantou-se. Caminhou cabisbaixo ao longo do palco. Mãos atrás das costas. Deu meia-volta e regressou para o pé da cadeira. Apenas se ouvia o zumbido das moscas, um esporádico estalo de quem tentava matar alguma, e o raspar da sola dos sapatos de pele dele contra a madeira do palanque.
— Bom. — Rodou sobre os pés, ficando de frente para os presentes. Os rostos revelavam incertezas, receio do que estava para vir. A decisão a tomar impunha-se, mas os olhares espelhavam dúvida. — Apresentados que estão os argumentos, uma decisão terá de ser tomada.
Agarrou uma mão com a outra, por trás das costas. Erguia e baixava os calcanhares, de forma ritmada, enquanto aguardava alguma reação.
— Ninguém tem nenhuma proposta? Nenhuma resolução? Nada?
Ouviram-se sinos. Ao fim de uma dúzia de badaladas, a porta do salão abriu-se com estrondo. Por ela entrou um homem. As calças de ganga e a camisola de gola alta denunciavam a juventude. No rosto, a barba rasa, negra, e o cabelo farto a combinar, contrastavam com a brancura e raridade do cabelo do homem que estava diretamente à sua frente, ao fundo do corredor.
— Eu sou a resposta, e a resposta a essa pergunta sou eu.
— E você quem é? — questionou o homem mais velho. O tom de voz mostrava o aborrecimento que sentia por aquela interrupção.
— Eu sou quem vem depois.
— Depois de mim?
— Sim. Depois de ti.
O velho desceu os dois degraus e avançou em direção ao novo.
— Já está na hora?
— Está — respondeu o novo. — Não ouviste os sinos?
— Já não ouço assim tão bem, sabes.
Aproximou-se do novo. Parou por um momento a olhar para ele. Recordava-se de quando entrara assim, de rompante, com toda aquele energia e força. Virou os olhos para o chão e seguiu caminho, saindo da sala.
O novo fechou as portas, inspirou fundo, e dirigiu-se ao palanque.
— Bom — disse, virando-se para a plateia. — Então, quais são as resoluções que têm para mim?